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DO ACONSELHAMENTO FILOSÓFICO


Quando a Filosofia surgiu na Humanidade através da consciência grega há mais de dois mil anos atrás, não tinha outro propósito ou finalidade senão o de ajudar o homem a viver melhor. A reflexão era despoletada por situações comuns e tinha como objetivo, não a ruminação intelectual de conceitos etéreos, mas a resolução de problemas concretos.

O modo como o homem vive está diretamente ligado ao seu grau de conhecimento/consciência. Esta é a base da “revolução ética” iniciada por Sócrates e que lançaria a semente desta vertente fundamental da filosofia - o homem ignorante vive mal e é infeliz (ou é infeliz e vive mal porque é ignorante). Não se trata da ignorância de quem não “sabe a matéria”, chumba na escola ou não tem um curso mas da ignorância acerca da realidade, de nós próprios e das razões da nossa existência.

Esta verdade, tão simples mas tão negligenciada, foi-nos transmitida por todas as grandes tradições sapienciais, do Oriente ao Ocidente, e a Filosofia surgiu imbuída dessa mesma consciência. O conhecimento/consciência é essencial ao Homem, à sua realização, à sua felicidade, quer seja transmitido pela via emocional das Religiões, seja pela via racional da Filosofia e dos Mistérios.

Naqueles tempos, uns séculos antes de Cristo, as pessoas ocupadas com os seus afazeres e sem tempo para se dedicarem a grandes reflexões, quando precisavam de uma orientação recorriam ao aconselhamento filosófico, e todos sabiam onde encontrá-lo.

Sabiam que os Estóicos se reuniam no Pórtico, à vista de todos; era conhecido que os Epicuristas viviam no seu “Jardim” na parte de fora da cidade, ou se preferissem o conselho de Diógenes dirigir-se-iam para o mercado onde o encontrariam dentro de um barril.

Pela evolução e conjugação de diversos fatores, séculos mais tarde a Filosofia tornou-se uma disciplina elitista e teórica, fechada numa académica torre de marfim, à qual só tinham acesso alguns privilegiados.

Durante vários séculos o homem comum, em caso de angústia existencial, ficou entregue à sua sorte, condicionado a recorrer aos sacerdotes, videntes, bruxas ou vendedores ambulantes. O estudo estava ao alcance de poucos, as tradições sapienciais fecharam-se em círculos esotéricos, e o conhecimento tornou-se a arma com que os poderosos legitimaram o seu controlo.

Este vazio deixado pela Filosofia foi ocupado pelo mercado da auto-ajuda, enchendo as prateleiras de livros mágicos que prometem resolver rapidamente a infelicidade das pessoas꞉ como ter abdominais de ferro, como fazer amigos, como ter uma carreira de sucesso, como encontrar a alma-gémea, como ganhar o euromilhões…

(É razão para perguntarmos ꞉ com tantas receitas de felicidade e sucesso, como pode existir tanta gente infeliz? )

Lendo atentamente alguns destes livros, descobrimos que muitas das suas ideias são inspiradas nas máximas dos filósofos gregos. O problema da auto ajuda é que extrapola afirmações como a origem da nossa realidade estar nos nossos pensamentos, criando nas pessoas a espectativa de que para se ser rico, basta pensar em dinheiro…

Na verdade, os gregos não disseram que os nossos pensamentos criam a realidade mas que os nossos pensamentos têm efeito sobre as nossas emoções e estas influenciam o modo como percepcionamos a realidade.

Este tipo de abordagem facilitista, porque falaciosa, dificilmente conduzirá a uma real transformação do homem e dos seus problemas. É mais agradável, espetacular e fácil, mas provavelmente não tão eficaz e consistente como o trabalho de interrogação, reflexão e organização que o Aconselhamento Filosófico implica.

Eu pessoalmente considero o Aconselhamento Filosófico uma terapia, na medida em que tem como função o tratamento de algo disfuncional – neste caso os processos mentais de acordo com os quais interpretamos a realidade. Como em qualquer terapia, tem que haver uma formação e preparação de quem a exerce, sob pena de provocarmos danos sérios em quem a ela recorre.

As exigências formais e legais deste tipo de atividades são – infelizmente – necessárias, não para dificultar a vida dos profissionais mas para defender os interesses de quem a elas recorre.

Surgindo como área nova de especialização da Filosofia, o caminho está no início, ainda muito no apuramento teórico de conceitos e estratégias. Mas pelas mesmas razões surge totalmente voltada para o futuro, aberta a novas abordagens, dimensões existenciais e mundividências.


Teresa Furtado Coelho





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